A cartomante

Luíza Breu decidiu voltar à cartomante. Tinha encontrado nos arquivos uma folha de caderno com as anotações de Luzia. Luzia era a cartomante e voltava à história com seus escritos de próprio punho. Lhe vejo de mãos dadas com alguém, com uma criança no colo e de frente pro mar, escreveu no que denominou de “o amanhã de Luíza”. Já fazia dois anos daquele encontro e ela tinha acertado quase tudo.
Breu teve muito medo de voltar, afinal de contas, o que prometeria, o que diria mais do destino que chegara e a assustara por tanto tempo? O que sabia já era suficientemente grande. Mas reencontrar-se com Luzia parecia uma chave para desenrolar os mistérios da narrativa, já que ela havia reaparecido sem que marcasse hora ou local. Veio pelo acaso. E reembaralhar as cartas seria incluir mais fios no tear da narrativa, dar continuidade àquele jogo sem fim de narrar a vida, este vício incurável da personagem.
Luíza fora ao seu encontro, rememorando cada detalhe da última e única vez que estivera ali. Luzia, muito branca, com os pêlos e olhos muito claros, a recebeu com um torço na cabeça muito vermelho e um óculos desses de armação invertida, sorridente, embora contida e solene. Luíza percebera de imediato que a casa da cartomante era agora outra e que tudo aparentava os cenários das revistas de decoração. Não era propriamente o cenário que povoava o imaginário de Breu.
A cartomante levou-a para a salinha de consultas, que agora era tão somente luz branca e tecidos lilás, e começou interrogando-a: por que voltou? Porque perdi o medo, disse Luíza. O medo do futuro. Não é isso que as cartas dizem, concluiu poucos minutos depois. E o tarô não mente nunca, filha, o tarô é a única coisa que eu acredito.