II

[fuga número dois ou dramaturgia em trânsito]

- Brigado.
- Pelo o que?
- Por isso.
- Brigada também.
- Vamos sair?
- Como é que ‘cê quer eu saia com esse homem nu na minha cama?
- Vai viver de fazer amor?
- E samba.
- Boa tarde.
- Boa tarde.
- É feriado?
- Nacional!
- Vamos sair?
- Quero preguiça.
- Eu quero isso, me dá?
- Dô.
- Deixa eu te mostrar meus trampos?
- Mostra.
- Essa aqui eu trouxe dos Andes.
- Aquela preta é a mais preciosa.
- Olha esse. Isso aqui é cobre.
- Cê é um artista.
- Que é isso?
- Minha tese. Olha aí.
- Tem figura?
- Quase nada.
- Eu gosto é de figuras.
- Não tem problema.
- Quer tequila?
- Um trago.
- Boa noite.
- Boa noite.
- Toma esse plástico.
- Só uma, vai.
- Não pode.
- Quero te sentir.
- Tá.
- Sentiu?
- Senti.
- Senti.
- Baby?
- Hum.
- Bora voltar?
- Pra casa?
- Pro ninho.
- Bom acordar assim, com cafuné!
- Bom dia.
- Bom dia.
- Tenho que trabalhar.
- Demora de atravessar essa baía.
- Que horas eu volto?
- Logo.
- Fica aqui?
- Até domingo.
- Na minha cama?
- Quando você for, eu vou.

- Alô?
- Oi.
- De boa?
- Não gosto de samba.
- Nos vemos pelo mundo, então.
- Tchau.
- Beijo.
- Tchau.

- Alô?
- Oi, sou eu! Chego aí oito da noite e vou direto pro chá de bebê.


/BR/

- Foi um bom momento.
- Tava precisando disso, né?
- Pô!
- De repente vocês dois.
- Ele nem deve ter mais memória, Paco.
- Como é estar de volta?
- O passado é uma roupa que não nos serve mais.
- Te veste e vamos dançar.
- Me empresta essa camisa?
- Posso cortar?
- Sonhei com a voz dele dizendo “Alô, meu amor. Tô aqui.”
- Tu quase não dorme.
- São essas cigarras.
- É a chuva, minha amiga.
- Coisas de abril.

- Alô?
- Alô! Quem é?
- Sou eu. Liguei pra dizer da saudade.
- Engraçado.
- É verdade.
- Não, é que sonhei contigo hoje.
- Então estamos sintonizados.
- Tá onde?
- Na rodoviária.
- Hum.
- Como tá aí?
- Uma loucura. Tenho ouvido muitos discos, conversado com pessoas. E você?
- Ah, eu sou apenas um rapaz latino americano sem dinheiro no banco.
- Sei.
- Saudade. Você não acredita, mas saudade.
- Sinto saudade também.
- Me dá teu e-mail?
- Pega esse.

- Bjo. Bjo. Bjo.

- Durmi não.
- Drume, neguinha.

- Ele chegou tarde um dia, Paco, e só sosseguei a espera quando senti o peso do braço dele numa concha.
- É o toque, minha amiga.
- Cata minha cabeça?
- Ah, depois.
- Vou raspar o cabelo.
- Sério?
- Meu Deus do céu.
- Vai mudar o que já está mudo.
- Quero nascer de novo.
- Vai ficar parecida com esse bebê.
- Como é perversa a juventude do meu coração.
- Mais que as paixões, os seus motivos. Não era isso que tinha escrito?
- Em azul, eu me lembro.
- Vamo andar um pouco?
- Consigo não.
- Que prazer mais egoísta!
- Vai dar tudo certo, né?
- Claro, amiga.
- Quero que acabe logo. Já é hora de ir.

- Boa tarde. Obrigada pela presença de todos, poucos.

- Um brinde!
- À Mestre!
- Mestre de obras.

- Vasco, a saideira é por conta da casa?

- Tchau, meus queridos. Agora vôo.

/BR/


- Volto da, crase no a. Volte de, crase pra quê?
- Silêncio.
- Cadê sua voz no eco vazio deste quarto?
- Silêncio.
- Cadê sua voz perdida nestes caracteres em negrito?
- Silêncio.
- O que afinal de contas você quer me dizer com esses excessivos “rs” e “bjos”?
- Rsrsrsrsrs.



- Aquilo que ele não diz. Porque não sabe.

- Alô? Tá ocupada? Ah, ele disse que não era sincero com ele mesmo. Disse que quer ombro, que sente falta de alguém na cama, que não gosta do quarto, mas que era um mal-estar momentâneo. Transitório, ele disse. Disse que me adorava várias vezes, mas disse também que aquelas palavras eram porque estava embriagado de algo que os homens grandes bebem e que estava cansado e que iria sair correndo como sempre fez. Me ligou, me chamou de amiga e me deu um monte de peças sem pé nem cabeça. Mentiu, desmentiu, voltou atrás. Porque falou também que só não era sincero com ele. .... é .... é ... também acho.

- Ela também estava perdida e por isso se agarrava a mim também.

- Alô? Boa tarde. Tem ônibus pra Tocantins?

- Cresça e desapareça.

- Me diz o que tu quer?
- Silêncio.
- Silêncio.

- E se?
- Decide.
- Silêncio.







- Lígia, responde, Lígia. Ligiá? Taí? Lígia, não deixa de ser minha amiga? Lígia, eu volto. Agosto, Lígia. Agosto eu volto. Ligiá? Eu jamais poderia casar com você, Ligiá! Lígia, te mereço não, Lígia. Mas, Lígia, não some? Breu, é sério, me liga mais tarde?








- Chega de saudade. Chega de saudade. Chega.